segunda-feira, 2 de abril de 2012

Desapego


Desapego - Matéria do correio brasiliense


Desapego
Terapia do armário

É tempo de se livrar dos excessos. Veja algumas ideias do que fazer com o que não se usa ou não se quer mais — o alívio é garantido

• Olívia Meireles
Especial para o Correio

Não estamos no Natal mas a Páscoa é um momento especial tanto quanto então vamos lá......


Natal já foi uma época em que todos doavam, compartilhavam, dividiam. Mas ficou pouco desse costume. A sociedade contemporânea transformou a comemoração do nascimento de Cristo no feriado mais consumista do ano, que pode ser redefinido pelos verbos: comprar, ganhar, receber. O resultado: as pessoas têm mais que do precisam e acumulam excessos. “Temos mais de 3 mil itens em nossas casas”, calcula a personal organizer Jane Mattos. “Há uma eterna insatisfação que faz as pessoas comprarem mais do que precisam. Muitos acreditam que os objetos podem compensar problemas e evitar que se trabalhem questões internas”, reforça a psicóloga Dulcinéia Cassis.

Há muitas famílias e especialistas, entretanto, que tentam alertar sobre os impactos do excesso de consumo no fim de ano. Eles afirmam que, para não chegar à compulsão materialista, o segredo é doar e jogar fora o supérfluo. “O Natal é ideal para arrumar a casa, pois as pessoas estão interessadas e abertas em ter uma vida melhor. É a hora de se fazer uma reforma íntima”, explica a personal organizer Cristiane Joffily. Jane Mattos acrescenta que é importante não levar objetos inúteis de um ano para o outro, para que se possa fazer um balanço do período.

Para se livrar de tanta tranqueira, uma palavra está em voga: desapego. A regra é simples: entra um, sai um. “Se saírem dois ou três, melhor ainda”, diverte-se a personal organizer Cristina Fonseca. A consultora de moda Costanza Pascolato argumenta que esse processo todo interfere até no autoconhecimento. “Ter menos coisas no guarda-roupa ajuda a criar um estilo pessoal.”

Todas as especialistas sugerem que o processo seja repetido pelo menos duas vezes por ano. E não deve ficar restrito ao armário feminino. Utensílios de cozinha, roupas de cama e banho e o quarto das crianças também devem passar por um pente-fino. “Há tanto lançamento infantil que os brinquedos são repostos rapidamente”, argumenta Jane Mattos. É importante, entretanto, que as crianças colaborem nesse processo para que elas criem o hábito de limpar o armário. “Tenho percebido que, quanto mais novo, mais fácil se desprender das coisas materiais”, acrescenta Jane.

Não quero mais. E agora?

Depois de uma arrumação geral, é preciso avaliar o que sobrou. O que pode ser reaproveitado e o que deve ser jogado fora? Há vários fins para cada peça. É preciso considerar a sua situação financeira, pensar em quem necessita daquele objeto e qual é o lugar adequado para dispensá-lo. A Revista preparou um pequeno guia com o que deve ser feito a partir do que foi retirado.

DOAR
Avalie se as peças estão em boas condições. Lembre-se primeiro das pessoas próximas de você que podem fazer bom uso do que sobrou. Costanza Pascolato, por exemplo, faz um bazar de suas roupas na confecção em que trabalha. Depois procure instituições que aceitem doações. Separe o que sobrou por temas: crianças, idosos, meio ambiente. Há locais que aceitam material quebrado. Mas o ideal é enviar produtos em bom estado. Às vezes, é possível providenciar pequenos reparos antes da doação.

VENDER
Se você está precisando do dinheiro, há várias opções divertidas. A mais simples é vendê-las em um brechó. Mas pode-se, por exemplo, organizar um garage sale no jardim de sua casa, estabelecendo preços justos. Ou juntar as amigas e fazer um troca-troca. Outra dica vai de Naiana Lage, que coordena o brechó virtual Enjoei (e tô vendendo): abrir um blog e comercializar suas peças, de amigos e até desconhecidos.

RECICLAR
A personal organizer Cristiane Joffily é enfática: “Não jogue nada fora, tudo pode ser reaproveitado”. O que não serve para doar ou vender ainda pode ser reciclado. Existem instituições que recolhem o lixo e fazem uma triagem. Outras reciclam metais e material de informática. Algumas entidades aceitam produtos de plástico quebrados. Não desperdice o que pode ser reaproveitado e procure o local ideal para doar essas peças.

Desapego
Como organizar tudo?

A tarefa de organizar requer desapego. A empresária e consultora Costanza Pascolato sugere que o processo deve ser acompanhado por uma música alta e agradável. O ideal é que esteja emocionalmente pronta para se desfazer de coisas antigas. Deve-se começar tirando as coisas de dentro do armário e organizando-as em três pilhas: doação, não sabe e guardar. Quando essa primeira avaliação terminar, faça uma faxina no armário.

As peças que vão ficar devem ser organizadas por cores: as mais claras primeiro até a tonalidade mais escura. Assim como devem ser separada por tipos: calças, camisas, camisetas. Os cabides devem ser padronizados. Nas primeiras gavetas, as coisas miúdas. Em prateleiras na altura da vista, devem ficar as roupas mais usadas. Já as peças sazonais, como casacos de inverno, devem ser guardados na parte mais alta ou baixa do armário, arrumadas em sacos de TNT (tecido-não-tecido) e não em plástico, pois mofam e estragam.

A pilha mais difícil de se livrar é a do “não sei”. Ela merece ser reavaliada depois que a primeira fase for terminada. A primeira pergunta que se deve fazer com uma peça na mão é: há quanto tempo eu não uso isso? Se a resposta for entre seis meses e um ano, desfaça-se da roupa. Não fique presa ao passado. Se engordou, não guarde a roupa para usá-la caso emagreça — compre uma nova. Outra coisa que se deve considerar é o estado das peças. Roupas brancas que ficaram amareladas e itens rasgados, por exemplo, devem ser retirados ou consertados.

É claro que todo mundo guarda coisas cujo peso afetivo é muito grande, mas deve-se ter limites. Jane Mattos sugere que fiquem apenas duas ou três peças nessa condição. “O resto tire foto e guarde-as, que ocupa menos espaço”, desafia. Costanza Pascolato é menos radical. Ela confessa à Revista que tem peças históricas que nunca joga fora, como alguns itens de Yohji Yamamoto, Chanel, Jean Paul Gautier e Giorgio Armani.

Caso ainda seja difícil, a psicóloga Dulcinéia Cassis sugere que se faça uma busca interna para descobrir porque cada objeto daquele tem um vínculo emocional. É preciso trabalhar essas questões para conseguir se desvincular dos objetos. “Um ambiente desorganizado pode trazer sobrecarga na lembrança”, argumenta. Uma técnica que a personal organizer Cristiane Joffily ensina às suas clientes é ficar segurando o item na mão enquanto se decide o que fazer com os outros. “Assim, você tem tempo e contato com aquele objeto para saber se ele realmente é importante.”

Para Costanza Pascolato, o momento de desapego deve ser acompanhado de música alta

Para repensar

A empresária Vandinha Riccioppo garante que, para ela, arrumar armário é uma terapia. Sempre que está nervosa, estressada ou triste, liga uma música alta e começa a arrumar tudo. “Me acalma, nessa hora eu organizo os meus pensamentos e avalio peça por peça, o que tem a ver comigo”, conta. Ela cultiva esse hábito desde adolescente. “Eu percebo, conforme os anos vão passando, que esse processo faz com que eu seja mais criteriosa na hora de comprar, pois sei exatamente o que eu tenho.”

Ela não tira apenas peças que usou muito, mas qualquer coisa que não lhe traga conforto. “Já era o tempo que ficava segurando um sapato lindo que machucava o meu pé inteiro. Me livro de tudo.” Faz isso pelo menos duas vezes por ano. As primeiras beneficiadas são as famílias que trabalham em sua casa e em sua loja de decoração, além das instituições que ajuda há anos.

Vandinha conta que sempre fez questão de que os quatro filhos criassem o mesmo hábito. E que, ao ganhar presentes, já ficasse automático o ato de doar. Aos 10 anos, o mais novo já sabe que no Dia das Crianças e no Natal tem que dar brinquedos para ganhar novos. “Faço questão de levá-lo comigo no dia de dar, para que ele veja o quanto o gesto dele é importante para outras crianças.”

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